10 de janeiro de 2010

Coisas que nunca mudam

Eu lembro da época da ditadura. Era pequenininha, e vi o Geisel na TV anunciando o AI5. Lembro da minha mãe assustada, minha tia o xingando de nomes que eu não sabia o que significavam. Ela era meio desbocada.
Sei que uma outra tia me levava e buscava na escola enquanto minha mãe trabalhava, sempre, todos os dias, muito aflita. Eu percebia a tensão das pessoas, desde as professoras até os amigos da família quando apareciam lá em casa. Nessas horas, geralmente me mandavam brincar no quarto porque eu não podia participar da "conversa de adultos".
Cresci entendendo tudo aos poucos, eram doses homeopáticas de consciência acerca do que acontecia no Brasil durante a minha infância e adolescência. Quando entrei na minha primeira faculdade já tinha opinião formada e um lado escolhido. Participei do diretório acadêmico da Santa Úrsula e cheguei a me engajar em manifestações estudantis. A ditadura já não era tão brava, mas nós ainda lutávamos por algo que nos parecia um ideal.
Daí, veio a democracia e tudo mudou, não sei se pra melhor ou pra pior, mas sei que, durante todos esses anos eu não tinha convivência com pessoas que apoiavam aquela ditadura. Mas sei que havia conservadores, gente que acreditava que comunista comia criancinhas, eu só não me dava com eles.
Aí, uns dias atrás, recebi um e-mail duas vezes, de pessoas diferentes. Essas mensagens que vão sendo repassadas sem que a gente saiba, ao certo, quem as criou. E veio a mensagem falando da Dilma, essa mesma, do Lula e que vai se candidatar a presidente. O e-mail relatava sua vida como guerrilheira, quando ela lutava contra a
ditadura ao lado de Lula e Zé Dirceu. Uma assassina, assaltante de bancos, criminosa etc, etc etc... Quem bolou esse texto, certamente não tem noção do que os militares fizeram naquela época. Não tem idéia de quantas vidas eles tiraram, até de inocentes considerados apenas suspeitos. Isso é a própria história que conta, são fatos e não há como negá-los.
O segundo e-mail chegou a pregar que a ditadura estava certa, pois os comunistas eram os "gafanhotos do Brasil", e quem votasse numa Dilma terrorista estaria trazendo de volta essa praga que iria devastar a nação, caso os militares não tivessem interferido.
Independente de comunistas, socialistas ou terroristas, eu não votarei na Dilma por questões óbvias que todo mundo já sabe, pois todos se decepcionaram com Lula e seus parceiros. Agora, mencionar o fato dela ter sido terrorista, é um pouco demais, porque uma coisa nada tem a ver com a outra. A ditadura foi uma guerra, e você tinha que escolher um lado. Quem lutou contra, tinha um ideal. Assaltos a banco eram pra arrumar grana pra continuar na briga, lutando por aquele ideal, não era pra encher as cuecas e as meias como hoje em dia. Não dá pra comparar, e o que me assusta é ver hoje, mesmo depois das aulas de história, gente que ainda pensa nisso e faz esse tipo de comparação.
Mas o que me assustou mais ainda, foi uma discussão que tive com alguém que namorei e, que decepção, disse que não votaria no Gabeira porque ele era sequestrador... Como assim??? Foi um susto enorme, porque a gente se apaixona e não consegue conhecer o outro em sua essência, daí ouve uma coisa dessas e chega a se perguntar, como eu me perguntei: em que época estamos vivendo, mesmo?
Muito estranho. Não sei o que aconteceu, mas ultimamente essas pessoas conservadoras e com esse tipo de pensamento têm cruzado o meu caminho, até mais do que naquela época. Nos anos 70, quando alguém dizia não saber que havia tortura e assassinatos, era considerado alienado. Talvez por alguma manifestação do destino, o universo conspirou e resolveu colocar esses alienados da minha geração, novamente na minha vida. Assim como naquele tempo, não faço a menor questão de que eles participem dela.

3 de janeiro de 2010

Machismo?

É difícil falar sobre machismo hoje em dia porque, assim como o preconceito, ele ainda existe e é velado. Quando converso com mulheres da minha faixa etária, chegamos à conclusão de que o machismo foi bastante incentivado na nossa própria geração e por nossos próprios pais.
Não tenho irmãos homens nem convivi com meu pai, mas muitas das mulheres que conheço reconhecem o machismo em suas famílias, e eu mesma lembro de como elas sofriam, quando éramos jovens, com essa espécie de "segregação". Nunca tiveram os mesmos direitos que os irmãos homens (mesmo os mais novos), e as que não conseguiram se libertar, saíram do machismo paterno para o do marido.
Estou escrevendo sobre isso porque, dias atrás, presenciei uma cena que no meu entender, foi promovida lamentavelmente pelo machismo.
Era um ambiente de trabalho em que uma mulher, por ter mais tempo de casa e conhecer o serviço, teve a incumbência de passá-lo a alguns funcionários recentes, um rapaz e um cara com quase a mesma idade que ela. Nada estava a favor dela naquele trabalho. Lembro que os documentos estavam perdidos, a desorganização era geral e eles teriam
que fazer hora extra até realizar o serviço, a pedido do patrão. E isso no dia 30 de dezembro!
Nenhum dos dois funcionários conseguiu realizar a tarefa satisfatoriamente, e um deles, o mais velho, avisou esse fato à chefe da seção. Esta, por sua vez, desesperada ao perceber que não conseguiria entregar tudo no prazo combinado, chamou a mulher e despejou sua ira sobre a coitada, que nem teve tempo de entender o que
o outro não tinha conseguido fazer.
E o outro, achando que ela tinha culpa por ele não conseguir, correu até o local onde as duas estavam e começou a esbravejar com ela como se estivesse brigando com um jogador de outro time que havia lhe acertado a canela.
Em momento algum ele parou para ouvir o que ela tinha a dizer, ou sequer se interessou se ela pretendia pedir-lhe desculpas, talvez pelo fato de, supostamente, não haver lhe passado o serviço de maneira que ele entendesse melhor o que devia fazer.
Uma cena constrangedora, daquelas que a gente vê na rua geralmente entre homens, quando um bate na traseira do carro do outro. Daí, alguém comentou: será que ele faria isso se não fosse uma mulher? Se fosse um cara maior do que ele, mais jovem e mais forte? E se aquela mulher fosse a chefe dele? E se ela fosse uma "gatinha"?
Fiquei escutando esses comentários no elevador, enquanto descia pra rua e acabei conversando um pouco com a mulher.
Foi quando ela disse que se lembrou dos irmãos, que faziam a mesma coisa quando jovens, e com a conivência dos pais. Ela e a mãe, tinham que lavar, passar, arrumar e cozinhar para eles. Nenhum deles tirava, sequer, o prato da mesa ao final das refeições. As roupas sujas eram jogadas no chão e ainda cobravam por uma camisa limpa e bem passada. Enquanto mãe e filha ralavam na cozinha, eles divertiam-se com a TV, dormiam, ou jogavam bola. Quando voltavam da escola, ela ajudava a mãe preparando o jantar enquanto eles faziam suas tarefas de casa, ou seja, continuavam estudando.
Não sei se a formação familiar daquele cara era algo semelhante, mas se ele se achou no direito de ter aquele comportamento num ambiente de trabalho, e com uma colega de trabalho, não me parece que tenha um comportamento diferente em casa.
Isso tudo coincidiu com um livro que li recentemente, "O Livreiro de Cabul". Coisas assim não acontecem somente no Oriente Médio. Rolam por aqui também, no Brasil, o maior país da América Latina, em pleno desenvolvimento e no berço da
maravilhosa democracia. E olha que já estamos em 2010!

Queria buscar imagens pra ilustrar este post, e acabei achando muitos blogs e sites que fazem considerações bem legais sobre o machismo. Vai aí um deles:

http://controleremoto.tv/blog/2009/05/analise-sobre-o-machismo/
Esse de baixo achei interessante. As imagens fazem parte de uma embalagem de jogo Batalha Naval. Tudo a ver...


http://imlg.wordpress.com/2009/09/02/brainwash-machista/