Hoje, dia das mães, o almoço com a minha foi na Feira Nordestina, em São Cristóvão. Tudo muito bacana, o povo não parava de chegar, todos querendo sair bem na foto com a estátua do Luis Gonzaga e eu e mamãe, já lá dentro, procurando um espaço para poder sentar e almoçar tranquilamente.
A idéia era comer algo o menos trivial possível, até porque minha mãe adora experimentar comidas, digamos, exóticas, e para satisfazer sua vontade, achamos um lugarzinho lá no meio do povão e pedimos cabrito na brasa, com fritas e arroz à grega.
O restaurante ainda não estava cheio, e lá fora, dois violeiros cantavam repentes em homenagem às mães de todo mundo. “... quem tem um pai não tem tudo e quem não tem mãe não tem nada...”
O som não parava, era a mesma melodia de poucos acordes e vozes quase sem melodia, tão alto que mal podíamos conversar, só gritar. Mas era dia de festa, e festa é assim mesmo, aquela música era a nossa cultura e parecia tocar os corações da galera que veio de longe viver aqui no Rio. Os repentistas tinham seu público, sentado em bancos lado a lado como numa igreja, todos de frente para o palco. Sérios, ouviam a música em silêncio como se ouvissem o sermão de um padre.
Depois de 35 minutos musicais, chegou o cabrito. Pratão cheio, não conseguiríamos dar conta de tudo aquilo, mas enfrentamos a aventura.
Eu, que em toda a minha vida nunca havia visto um cabrito no meu prato, fui cortando os pedaços com muita cautela. Isso porque, desde criancinha, tenho horror de gordura de carne. Tirava qualquer elemento que se parecesse com isso, fosse do bife, da carne assada ou até das carnes picadas do estrogonofe. Quase ganhei inimigos uma vez num churrasco, quando fiquei sozinha com a picanha que iria pra churrasqueira e resolvi livrar a todos da gordura que eu julgava excessiva.
Bom, diante desse temor que pareceu ganhar a realidade, descobri que a faca às vezes parecia cega. Eu cortava, cortava, e a carne do cabrito continuava inteira. Fui fazendo manobras para conseguir um pedaço isento aqui, outro ali, mas havia regiões que absolutamente não eram desfeitas pela faca. Que seria aquilo, aponeurose? Como eu não entendia de carne de cabrito, achei melhor não pagar o mico com o garçom, que àquela altura já estava desaparecido, uma vez que o restaurante encheu de repente e uma mesa com 22 barulhentos se armou exatamente atrás de mim.
Minha mãe teve mais sorte, conseguiu uma parte do cabrito sem muitas limitações, o suficiente para seu apetite de passarinho. Mas eu já achava que a batata frita estava mais para cozida. E continuava tentando encontrar algo que pudesse mastigar sem medo de sentir aquela textura que, imagino, para os nordestinos deve ser o máximo.
A música repentista recomeçou, agora parecia que o som estava bem mais alto. Um homem parou atrás de mim e resolveu conversar com outro lá de dentro, aos berros. Que merda de faca que não corta! Eu não sabia que parte do cabrito estava tentando comer, seria o peito? A coxa? Não entendo nem de cortes de carne de vaca, e me sentia impotente de perguntar ao garçom como se come um cabrito...
Os barulhentos agora disputavam com o som do palco em frente. Minha mãe já estava satisfeita e eu ainda tentava comer o animal, já perdendo o apetite, pois o arroz e a batata quase frita agora estavam frios. E foi aí que desisti. Tendo deixado o bicho todo retalhado no prato, só consegui beber uma coca cola, pois o gosto da gordura me saía pelos poros e pela respiração.
Paguei a conta e fomos embora, mamãe toda contente, e eu, enjoada no meio do cheiro de tanta comida que nos cercava até o portão da saída, ansiava pelo chá de boldo guardadinho lá em casa.
Sempre haverá próxima vez, mas vou preferir aquela carne de sol tradicional, que eu consigo enxergar e definir o que é gordura e o que não é. Cabritos, nunca mais.
10 de maio de 2009
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Dedeca (pra todo mundo saber seu lindo apelido),
ResponderExcluirFiquei muito feliz ao reencontrá-la,depois de vinte e tantos anos...
Este blog será maravilhoso para conhecer bem o seu "jeitinho especial" de ser.Servirá também para nos alertar de suas guerras contra as deliciosas gorduras. Quando li a história da picanha... não sabia se ria ou se relia a frase,sem querer acreditar ou tentando imaginar que voce estava inventando.INACREDITÁVEL! Bom saber pois,caso aconteça um churrasquinho com a minha e sua presença,te manterei longe da cozinha e da churrasqueira. Aliás,tem certeza que a galera te perdoou por ter feito "aquilo" na picanha?
Carne de cabrito é uma delícia,aposto que sua mãe repetiria o menu. Tente comer "Cabrito a Napolitana",algo tentador...
Estarei sempre aqui,lendo seus textos.
Te gosto muito,acho que foi esse seu jeitinho que me conquistou pra sempre.
Beijos com carinho,da amiga de sempre.
Alba Bloechliger
a picanha de carne de sol é uma boa pedida para uma segunda chance. Queijo coalho assado pra acompanhar o prato mais baião de dois e macaxeira frita. Perfeito! hum... deu até vontade!
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